Nos últimos anos, o cenário das apostas esportivas online tem experimentado um crescimento significativo em todo o mundo, impulsionado pelo avanço da tecnologia e pela expansão da internet.
No Brasil, essa tendência não é diferente, e o interesse por jogos de azar e apostas esportivas na internet tem aumentado consideravelmente. Além disso, recentemente tivemos alguns escândalos sobre manipulação de resultados por parte de importantes jogadores de futebol.
Afinal, como as empresas esportivas e de apostas online podem se proteger deste tipo de risco reputacional? Ainda, quais são as mudanças trazidas pela MP 1182?
1. Legislação sobre apostas esportivas
No Brasil, até 2018, a legislação que abordava o tema de apostas e jogos de azar era o Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941, conhecido como Lei das Contravenções Penais. Esse decreto estabelece a prática do jogo de azar como contravenção, exceto para jogos permitidos por lei, como as loterias federais.
Em 2018, foi publicada a Lei 13.756, que representa um marco importante para o cenário do esporte no Brasil, pois trata especificamente sobre a regulamentação das apostas esportivas no país. Essa legislação foi um passo significativo em direção à criação de um marco regulatório para o setor, abordando as modalidades de apostas esportivas de cota fixa.
- Apostas Esportivas de Cota Fixa: Essas modalidades de apostas envolvem a previsão de resultados em eventos esportivos específicos, com odds (cotas) pré-determinadas no momento da aposta.
- Apostas Esportivas como loteria: Ainda, as apostas esportivas foram consideradas loterias de exploração do setor público, podendo ser concedida ou autorizada pelo Ministério da Fazenda ao Setor Privado.
- Integridade: Outro ponto relevante abordado pela lei é a preocupação com a integridade do esporte. A legislação prevê a criação do Sistema Nacional de Integridade no Esporte, com o objetivo de monitorar e prevenir a manipulação de resultados em competições esportivas. Essa medida visa combater a corrupção no esporte e garantir a lisura das competições.
Nos últimos dias, foi sancionada a MP Nº 1.182 de 2023, que entre as suas mudanças mais significativas está na inclusão do caráter oneroso desta autorização do Ministério da Fazenda. Também foram incluídas as responsabilidades regulatórias da autorização e fiscalização das apostas para o Ministério da Fazenda, assim como ao CONAR caberá a regulamentação e fiscalização do marketing destas plataformas.
Sobre as plataformas de apostas não autorizadas, a MP traz que:
- As empresas divulgadoras de publicidade ou propaganda, após comunicação do Ministério da Fazenda, procederão à exclusão das divulgações e das campanhas irregulares, nos termos do disposto no caput.
- As empresas provedoras de conexão à internet e de aplicações de internet, após notificação administrativa do Ministério da Fazenda, procederão ao devido bloqueio dos sítios eletrônicos ou à exclusão dos aplicativos que ofertem a loteria de apostas de quota fixa sem a outorga de que trata o art. 29.
Fica também proibido, mediante regulamentação das competições esportivas, que organizações de prática desportiva e atletas veiculem nomes e marcas de empresas que ofertem ou explorem loteria de apostas de quota fixa, em todas as suas propriedades de marketing que possam ser objeto de acordo sobre veiculação de marcas, sem a devida autorização.
2. Integridade das apostas esportivas
Em vista dos citados escândalos de manipulação de resultados, para garantir a integridade dos eventos esportivos a MP ainda traz que:
a) Sócio ou acionista controlador de empresa operadora de loterias de apostas de quota fixa, individual ou integrante de acordo de controle, não poderá deter participação, direta ou indireta, em Sociedade Anônima do Futebol ou em organização esportiva profissional, nem atuar como dirigente de equipe desportiva brasileira.
b) O agente operador adotará mecanismos de segurança e integridade na realização da loteria de apostas de quota fixa.
c) Os eventos esportivos objeto de apostas de quota fixa contarão com ações de mitigação de manipulação de resultados e de corrupção nos eventos reais de temática esportiva, por parte do agente operador.
d) O agente operador integrará organismo nacional ou internacional de monitoramento da integridade esportiva.
e) O Ministério da Fazenda poderá, no exercício da atividade fiscalizatória, determinar a suspensão ou a proibição, a todos os agentes operadores, de apostas em eventos intercorrentes ou específicos, ocorridos durante a prova ou a partida, que não o prognóstico específico do resultado final.
f) O agente operador reportará eventos suspeitos de manipulação ao Ministério da Fazenda no prazo de cinco dias úteis, contado a partir do momento em que o agente operador tomou conhecimento do evento suspeito.
g) É vedada a participação, direta ou indireta, inclusive por interposta pessoa, na condição de apostador, de: I - proprietário, administrador, diretor, pessoa com influência significativa, gerente ou funcionários do agente operador; II - agente público com atribuições diretamente relacionadas à regulação, ao controle e à fiscalização da atividade no nível federativo em cujo quadro de pessoal exerça suas competências; III - menor de dezoito anos de idade; IV - pessoa que tenha ou possa ter acesso aos sistemas informatizados de loteria de apostas de quota fixa; V - pessoa que tenha ou possa ter qualquer influência no resultado de evento real de temática esportiva objeto da loteria de apostas de quota fixa, incluídos: a) pessoa que exerça cargo de dirigente desportivo, técnico desportivo, treinador, integrante de comissão técnica; b) árbitro de modalidade desportiva, assistente de árbitro de modalidade desportiva, ou equivalente, empresário desportivo, agente ou procurador de atletas e de técnicos, técnico ou membro de comissão técnica; c) membro de órgão de administração ou fiscalização de entidade de administração de organizadora de competição ou prova desportiva; e d) participante de competições organizadas pelas entidades integrantes do Sistema Nacional do Esporte; VI - pessoa inscrita nos cadastros nacionais de proteção ao crédito; e VII - outros casos a serem estabelecidos pelo Ministério da Fazenda.
Neste sentido, é muito importante que as plataformas de apostas esportivas estabeleçam controles internos de integridade e de KYC, para cumprir com as determinações da MP e futuras regulamentações do CONAR e Ministério da Fazenda.
KYC, que significa "Know Your Customer" (Conheça o seu Cliente), é um processo essencial utilizado por empresas e instituições financeiras para verificar a identidade de seus clientes. O objetivo principal do KYC é prevenir atividades ilícitas, como lavagem de dinheiro, financiamento ao terrorismo e outras práticas criminosas, além de garantir a conformidade com as regulamentações e leis aplicáveis. No caso das apostas esportivas, esse procedimento terá o objetivo principal de barrar as pessoas proibidas pela MP de apostar, assim como aquelas que trazem risco à organização.
O compliance de integridade é uma abordagem proativa que busca promover uma cultura ética dentro das organizações. Trata-se de um conjunto de práticas, políticas e diretrizes que visam garantir que a empresa esteja em conformidade com leis, regulamentos e padrões éticos, além de prevenir a ocorrência de fraudes, corrupção e outras condutas inadequadas. Essa abordagem vai além do mero cumprimento de normas, pois busca estabelecer um ambiente corporativo em que a integridade e a ética sejam valores fundamentais.
Outra questão importante a ser considerada, é que as plataformas devem buscar a autorização do Ministério da Fazenda, que estabelecerá os requisitos para concessão, que devem englobar principalmente os citados controles de KYC e integridade.
Dessa forma, é muito importante que este tipo de plataforma busque ajuda jurídica especializada para conduzir o processo de autorização junto ao Ministério da Fazenda, assim como os procedimentos e políticas internas de KYC e integridade.
Por Laís Arduini